Resenha Maio 2011:
Tema: Livro reportagem / Mês: Maio – opção 3
por Cleia (cleia.le@bol.com.br)

título: UM ESTRANHO EM GOA
autor: José Eduardo Agualusa
editora: Gryphus
páginas: 155 páginas
título original: Um Estranho em Goa


Quem conhece um pouquinho da obra de José Eduardo Agualusa sabe o tanto que este extraordinário escritor angolano se interessa pela língua portuguesa, sua dinâmica, e as diversas formas de apropriação e de intercâmbio entre os povos do planeta que a utilizam. Questões como memória e identidade também são temas sempre recorrentes em sua obra.
Goa, um pequeno território situado na costa oeste da Índia, esteve subordinado a Portugal como colônia a partir de 1510, época das grandes navegações. Retomada para a Índia desde 1961, hoje é um pedacinho da Índia onde vivem indianos, descendentes de portugueses e ainda se fala Português.
Pois bem. Neste livro o autor vem nos contar o que lá conheceu, numa abordagem sensível e cosmopolita. Embora “Um Estranho em Goa” não seja propriamente um livro reportagem, posto que há nele muito de ficção, esta classificação cabe-lhe bastante bem.
A história inventada é que ele, o narrador, o jornalista angolano José, vai a Goa em busca de um personagem para um livro que pretende escrever: um ex-guerrilheiro da guerra de libertação de Angola, com passagem pela Amazônia, agora radicado em Goa. Esta ficção, no entanto, se desenrola apoiada em circunstâncias históricas e situações reais e, eventualmente, vinculadas a outros acontecimentos em países de língua portuguesa em 3 continentes.
Por meio de encontros com personagens diversificados, goeses, imigrantes e turistas, em festas, cafés, restaurantes, livrarias, residências, o narrador vai reportando o processo de retomada do território de Portugal pela a Índia e o período de descolonização que se seguiu, marcado pela busca de identidade de Goa, não propriamente indiana e não mais portuguesa também. A narrativa vai conduzindo mansamente o leitor à reflexão – sobre a permanência da cultura católica portuguesa, o confronto com as religiões e tradições orientais, a progressiva utilização do inglês – e ao deleite com a paisagem, o clima, a vegetação, os sabores, os aromas, as cores e, dessa forma, o transcultural Agualusa descortina, para o fascinado leitor, um rico panorama daquele, para nós, desconhecido território.
É um livro pequeno, de linguagem clara e bem construída com emprego de poucas e precisas palavras a falar poeticamente de uma infinidade de coisas, como é característico em Agualusa. Um texto que não aprofunda os variados assuntos de que trata, mas informa, indica caminhos, critica, estabelece ligações com outras obras de literatura, arte, música, e induz ao sonho numa narrativa recheada de simbolismo, emoção e magia.
Claro, é inevitável falar de Índia, Angola e Brasil sem falar de misticismo e magia. Mas como integrar estas culturas numa única trama e ser conciso sem prescindir da poesia e absolutamente moderno ao tratar de memória e tradição?
Simples: basta saber português, ser o Agualusa e escrever este livro surpreendente, cujas 155 páginas (na edição que li) se transformam facilmente em 310, 620, 1240... multiplicando-se em progressão infinita não só pela necessidade de ser relido, como pelas inúmeras novas leituras que ele vem despertar. Imprescindível, não deixe de ler.
Nota: 5/5
Nota da capa : 5/5 – A capa (e a contra-capa) é lindíssima. Além de plasticamente equilibrada e harmoniosa, traduz perfeitamente aquilo que o livro é.


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