Resenha Desafio Literário  2011:
Tema: Épico / Mês: Março – opção 2
por Cleia (cleia.le@bol.com.br)
título: OS DIAS DO CERVO
autor: Liliana Bodoc
editora: Planeta do Brasil

páginas: 320
título original: Los Dias del Venado
tradução: Sandra Martha Dolinsky

Através dos tempos, longos tempos, o homem conquistou pela guerra o chão em que se assentou desenvolveu suas culturas – em todos os sentidos. E em cada cultura a história real foi sendo enriquecida pelas lendas e mitos transmitidos pela sucessão de gerações. No ocidente sempre nos reportamos à mitologia europeia, e até do oriente próximo, para compreender nossa origem. Gregos, romanos, celtas, árabes, judeus, escandinavos, enfim, é vastíssima a literatura disponível e mesmo infinita, porque está viva, inspirando permanentemente autores que sorvem do caldeirão das alegorias, fábulas e religiões, os ingredientes para a criação de novas e emocionantes histórias.  Não só os europeus mas os americanos, inclusive nós aqui do sul, também nos identificamos com elas. Afinal as Américas foram civilizadas por povos europeus.
Civilizadas? Não sei, não. Havia uma civilização florescente neste continente da qual pouco sabemos e pouco se fala, muito porque nossos antepassados anglos e ibéricos trataram de massacrá-la. Onde ficaram a cultura e as histórias pré-colombianas?
“Os Dias do Cervo” é o primeiro volume da  trilogia  “A Saga  d’Os Confins”, da argentina Liliana Bodoc e esta é a sua graça. A invenção de uma saga fantástica, mas verdadeiramente americana. Os Confins são as terras situadas no extremo sul de um continente denominado Terras Férteis. Terra de guerreiros valentes e honrados, onde mora a família em torno da qual de desenvolve a narrativa principal. Vivem em perfeita harmonia com a natureza e seus ciclos mas, um dia, os velhos astrônomos e bruxos da terra identificam sinais mágicos e verificam que antigos relatos indicam uma ameaça difusa de invasão e tomada do poder pelos exércitos do mal oriundos das Terras Antigas, que estão do outro lado do mar.  Representantes dos diversos povos das Terras Férteis são então convocados pelos Astrônomos da Casa das Estrelas para um concílio que articulará estratégias de defesa de seu território e de todas as formas de vida que conhecem. Os invasores virão por ordem do “filho da Morte”, síntese do “ódio eterno”.
Uma história ancestral sobre a luta pelo poder e pela defesa de culturas, territórios e liberdade. A analogia com a América antiga é evidente, porém é um mundo fascinante, imaginado pela autora, de personagens humanos cheios de emoção e de complexidade, integrados com a magia, capaz de mobilizar as forças de uma natureza pujante, que parece compreender que está, tanto  quanto os homens, ameaçada pelos “conquistadores” que vêm do outro lado do mar. Uma lenda possível, criada a partir das etnias americanas a se defender da invasão dos colonizadores europeus. 
Assim como  as pessoas, são personagens do livro as árvores, os rios,  o mar, a chuva, os animais, montanhas e seres fantásticos. A narrativa, estruturada a partir dos elementos épicos clássicos como a luta entre o bem e o mal, os heróis, as longas jornadas, coragem e  medo, amor e traições, não resvala para o terreno dos  maniqueísmos e estereótipos e combina de forma equilibrada a grandiosidade dos relatos épicos com a delicadeza de uma prosa poética de grande originalidade e riqueza ao descrever toda uma civilização, com suas cidades, templos, roupas, comidas, línguas e rituais. Bastante interessante também, são os nomes dos lugares, acidentes geográficos e personagens. Enquanto os povos das Terras Férteis têm nomes formados a partir da sonoridade das línguas indígenas da América, os nomes dos das Terras antigas parecem ter uma origem grega ou latina.
E se é que isso pode ser dito, é um livro sonoro, colorido. Leitura da boa para qualquer idade, uma aventura para crianças dos 8 aos 80. Pena que depois da última página fica um gostinho de “quero-mais”. Pelo que pude apurar, os livros seguintes, “Os Dias de Sombra” e “Os Dias de  Fogo” ainda não foram publicados no Brasil.  (*)
Nota: 5/5
Nota da capa : 3/5 – Capa e verso usam uma única imagem, uma gravura bem bonita. Mas reporta a uma cena de aspecto europeu, além de sóbria e fria. Merecia ser algo que comunicasse melhor a ambientação e a força da história. Vale visitar o site http://elartedelosconfines.blogspot.com  para conhecer o projeto de ilustração de Gonzalo Kenny, em  conjunto com Liliana Bodoc, para a trilogia.
(*) Quem se interessar e tiver facilidade de ler em espanhol, os dois volumes seguintes da Saga podem ser baixados pela internet: “Los Dias de La Sombra” e “Los Dias del Fuego”.


3 Comments

  1. Pôxa, que resenha bem feita. Épica! Gostei demais, principalmente pelo fato da atemporalidade da história fazendo com que se destine a um público variado. Parabéns!

    Beijocas

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  2. Eu gostaria mais do nunca,encontrar os dois últimos volumes TRADUZIDO,qualquer referência,informação ja serve,estou disposto a comprar os livros mesmo por um preço acima da média...

    É uma pena que este livro seja pouco difundido aqui no Brasil....

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